MENSAGEM Nº 070/2025

MENSAGEM Nº 070/2025

Santa Luzia, 07 de agosto de 2025.

Excelentíssimo Senhor Presidente,

Dirijo-me a Vossa Excelência, com cordiais cumprimentos, para comunicar que, o Chefe do Poder Executivo Municipal vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência e dos demais integrantes desta Egrégia Câmara Municipal, comunicar e justificar o VETO INTEGRAL a Proposição de Lei nº 144/2025, de autoria do nobre Vereador Waguinho, que “Autoriza o Poder Executivo instituir a Lei de Fomento aos Espaços Culturais Independentes no Município de Santa Luzia e dá outras providências”.

Verificados os pressupostos essenciais para as razões que adiante se apresentam, temos o conflito ensejador da oposição por motivação de inconstitucionalidade nos termos e fundamentos apresentados a seguir:

I – DA INCONSTITUCIONALIDADE EM RAZÃO DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES

Inicialmente, cumpre examinar a razão da apresentação de um projeto de lei autorizativo por um parlamentar, quando o mesmo poderia propor a aprovação de um projeto contendo um comando impositivo dirigindo ao Poder Executivo.

Prefacialmente cabe salientar que as leis autorizativas são aquelas que atribuem ao Poder Executivo a possibilidade da atuação, execução e realização daquilo já previsto anteriormente ou que não recai obrigação legal para o cumprimento.

Nessa vereda, os projetos de lei autorizativos têm sido amplamente considerados inconstitucionais quando invadem competências privativas do Poder Executivo ou violam o princípio da separação dos poderes.

Não obstante a pertinência temática, a proposição legislativa revela vício formal, por adentrar campo reservado à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo.

Lei no sentido técnico desta palavra, só existe quando a norma escrita é constitutiva de direito, ou, esclarecendo melhor, quando ela introduz algo no sistema jurídico em vigor, disciplinando comportamentos individuais, ou atividades públicas.

Neste quadro, somente a lei, em seu sentido próprio é capaz de inovar no Direito já existente, isto é, de conferir, de maneira originária pelo simples fato de sua publicação e vigência, direitos e deveres a que todo devemos respeito.

O projeto autorizativo, nada acrescenta ao ordenamento jurídico por não possuir caráter obrigatório para aquele a quem é dirigido. Apenas autoriza o Poder Executivo a fazer aquilo que já lhe compete, mas não atribui ao Poder Executivo de usar a autorização, nem atribui direito ao Poder Legislativo de cobrar tal uso.

A lei, portanto, deve conter comando impositivo aquele a quem se dirige, o que não ocorre nos projetos autorizativos, nos quais o descumprimento de autorização concedida não acarretará qualquer sanção ao Poder Executivo, que é destinatário final deste tipo de norma jurídica.

Portanto, a proposição legislativa que pretende “autorizar” o Poder Executivo a fazer aquilo que a própria Constituição Federal já lhe conferiu como prerrogativa – como é o caso da faculdade de iniciar o processo legislativo, nos termos do art. 61 da CF/88 – acaba por violar o princípio constitucional da separação de poderes (art. 2º da CF/88).

II – VÍCIO FORMAL POR AUSÊNCIA DE ESTIMATIVA DE IMPACTO FINANCEIRO E ORÇAMENTÁRIO

O art. 3º da proposição legislativa tem por objeto da concessão de isenção de “até 50% no valor do IPTU, para imóveis utilizados exclusivamente como espaços culturais” (inciso I) e “Isenção de taxas municipais para realização de eventos culturais” (inciso II), tratando, portanto de isenções tributárias.

Em que pese a existência de competência do Poder Legislativo para tratar sobre matéria tributária e a concessão de isenções, conforme já pacificado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – STF no julgamento do Tema 682 de Repercussão Geral, tratando-se de propositura legislativa que visa a concessão de isenção ainda que parcial, faz-se obrigatória a observância do disposto no art. 113 do ADCT da CF/88, sob pena de incidir em inconstitucionalidade formal. Vejamos a redação do citado dispositivo constitucional:

Art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro.         (Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)

O Texto Constitucional é expresso e não deixa dúvidas: a proposição legislativa que trata da instituição de isenção tributária deverá ser acompanhada da estimativa de impacto orçamentário e financeiro. Quer-se dizer que a elaboração dos estudos de impacto orçamentário e financeiro devem ser anteriores ou concomitantes à proposição legislativa.

Esse é o entendimento já pacificado pelo STF, in verbis:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REFERENDO DE MEDIDA CAUTELAR. LEI 1.983/2024 DO ESTADO DE RORAIMA. ISENÇÃO DE IPVA. AUTOMÓVEIS ELÉTRICOS, HÍBRIDOS, HÍBRIDOS PLUG-IN E A HIDROGÊNIO. AUSÊNCIA DE ESTIMATIVA DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. MEDIDA CAUTELAR REFERENDADA. I. CASO EM EXAME 1. Ação direta proposta para examinar a higidez formal de lei estadual que criou hipótese de isenção do IPVA. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Saber se a norma isentiva, ao acarretar renúncia de receita, previu a necessária estimativa de impacto financeiro e orçamentário, tal qual exigido pelo art. 113 do ADCT. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O regramento estadual, ao expandir as hipóteses de isenção de um tributo estadual sem a prévia, necessária e efetiva mensuração do impacto orçamentário, incorreu em inconstitucionalidade formal. 4. Proposta de conversão de referendo de medida cautelar em julgamento definitivo de mérito, considerando a existência de precedentes da CORTE quanto à matéria de fundo e a completa instrução dos autos, nos termos do art. 12 da Lei 9.868/1999. IV. DISPOSITIVO 5. Procedência do pedido para declarar a inconstitucionalidade da Lei 1.983/2024 do Estado de Roraima. (STF, Tribunal Pleno, ADI 7728 MC-Ref, Relator: Min. Alexandre de Moraes, Publicação: 21/02/2025).

EMENTA Recurso extraordinário. Direito tributário. IPTU. Isenção. Lei nº 2.982/20 do Município de Itirapina/SP. Ausência de prévia estimativa de impacto orçamentário e financeiro. Inconstitucionalidade. Artigo 113 do ADCT. Modulação dos efeitos da decisão. 1. De acordo com a jurisprudência da Corte, deve ser observado por todos os entes da federação o art. 113 do ADCT, o qual estabelece que a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. 2. Incidiu em inconstitucionalidade a Lei nº 2.982/20 do Município de Itirapina/SP, a qual dispôs sobre isenção de IPTU, em razão de a respectiva proposição legislativa não ter sido acompanhada de estimativa de impacto orçamentário e financeiro. 3. A isenção de IPTU a que se refere a lei questionada está relacionada a relevante aspecto social, beneficiando munícipes inseridos em contexto de especial vulnerabilidade. (…) (STF, Tribunal Pleno, RE 1343429, Relator: Min. Dias Toffoli, Publicação: 18/04/2024).

EMENTA: Direito constitucional e tributário. Ação direta de inconstitucionalidade. IPVA. Isenção. Ausência de estudo de impacto orçamentário e financeiro. 1. Ação direta contra a Lei Complementar nº 278, de 29 de maio de 2019, do Estado de Roraima, que acrescentou o inciso VIII e o § 10 ao art. 98 da Lei estadual nº 59/1993. As normas impugnadas versam sobre a concessão de isenção do imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) às motocicletas, motonetas e ciclomotores com potência de até 160 cilindradas. 2. Inconstitucionalidade formal. Ausência de elaboração de estudo de impacto orçamentário e financeiro. O art. 113 do ADCT foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 95/2016, que se destina a disciplinar “o Novo Regime Fiscal no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União”. A regra em questão, porém, não se restringe à União, conforme a sua interpretação literal, teleológica e sistemática. 3. Primeiro, a redação do dispositivo não determina que a regra seja limitada à União, sendo possível a sua extensão aos demais entes. Segundo, a norma, ao buscar a gestão fiscal responsável, concretiza princípios constitucionais como a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência (art. 37 da CF/1988). Terceiro, a inclusão do art. 113 do ADCT acompanha o tratamento que já vinha sendo conferido ao tema pelo art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, aplicável a todos os entes da Federação. 4. A exigência de estudo de impacto orçamentário e financeiro não atenta contra a forma federativa, notadamente a autonomia financeira dos entes. Esse requisito visa a permitir que o legislador, como poder vocacionado para a instituição de benefícios fiscais, compreenda a extensão financeira de sua opção política. 5. Com base no art. 113 do ADCT, toda “proposição legislativa [federal, estadual, distrital ou municipal] que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”, em linha com a previsão do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal. (…) 8. Fixação da seguinte tese de julgamento: “É inconstitucional lei estadual que concede benefício fiscal sem a prévia estimativa de impacto orçamentário e financeiro exigida pelo art. 113 do ADCT.”. (STF, Tribunal Pleno, ADI 6303, Relator: Min. Roberto Barroso, Publicação: 18/03/2022).

Como pode ser verificado do excerto supra, qualquer proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou promova renúncia de receita deverá estar, obrigatoriamente, acompanhada dos estudos acerca da estimativa de impacto orçamentário e financeiro, sob pena de claro descumprimento do comando legal insculpido no art. 113 do ADCT incide em inconstitucionalidade formal.

A Proposição de Lei nº 144/2025, além do descumprimento de preceitos constitucionais acima indicados, a documentação apresentada pela Egrégia Casa Legislativa encontra-se desacompanhada de qualquer documento que demonstre prévia realização do estudo de impacto orçamentário e financeiro, bem como o descumprimento do art. 14, incisos I e II, e dos artigos 15 ao 17, que condiciona a concessão, ampliação de incentivo ou benefício tributário, ou ainda a criação e ampliação de despesas obrigatórias.

A ausência desses elementos compromete a legalidade do projeto e afronta diretamente os princípios da responsabilidade fiscal, do planejamento e da eficiência administrativa (art. 37, caput, da CF/88).

III – CONCLUSÃO

Dado o exposto, a propositura se mostra inconstitucional por desrespeitar a iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo (art. 61, caput, da CF/99), afrontar o princípio da separação de poderes (artigo 2º da CF/88 e ao art. 6° da Constituição Estadual), bem como incorrer em renúncia de receita sem estar acompanhado da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro (art. 113 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias).

Diante de todo o exposto, são essas, Senhor Presidente, as razões que me levam a opor VETO INTEGRAL à Proposição nº 144/2025, devolvendo-a, em obediência aos §§ 1º e 4º do art. 53 da Lei Orgânica Municipal, ao necessário reexame dessa Egrégia Casa Legislativa.

Atenciosamente,

 

PAULO HENRIQUE PAULINO E SILVA

PREFEITO DO MUNICÍPIO DE SANTA LUZIA

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