MENSAGEM Nº 30/2025 – PGM

MENSAGEM Nº 30/2025

 

Santa Luzia, 07 de julho de 2025.

 

Excelentíssimo Senhor Presidente,

 

Dirijo-me a Vossa Excelência, com cordiais cumprimentos, para comunicar que, com base no § 1º do art. 53 e no inciso IV do caput do art. 71 da Lei Orgânica Municipal, decidi opor VETO integral à Proposição nº 068/2025 que “Autoriza o Poder Executivo a regulamentar, por meio de ato próprio, a aplicação de multa aos responsáveis pelo manuseio, utilização e soltura de fogos de artifício ou artefatos pirotécnicos com efeitos sonoros ruidosos no Município de Santa Luzia/MG”, de autoria do Vereador Glayson Johnny. Verificados os pressupostos essenciais para as razões que adiante se apresentam, temos o conflito ensejador da oposição por motivação de inconstitucionalidade nos termos e fundamentos apresentados a seguir.

 

Razões do Veto:

 

DA INCONSTITUCIONALIDADE

 

Embora o tema seja de grande relevância, verifica-se que o art. 2°[1] da Proposição de lei n° 068/2025 ao determinar que a definição dos critérios, valores, condições de aplicação e destinação da multa, caso venha a ser implantada, poderá ser realizada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo, afronta o princípio da legalidade. O mencionado princípio se encontra positivado no caput do art. 37 da Constituição Federal, de 1988[2], e no caput do art. 13 da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989[3], in verbis, respectivamente:

 

“Art. 37.  A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

…………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

“Art. 13.  A atividade de administração pública dos Poderes do Estado e a de entidade descentralizada se sujeitarão aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, razoabilidade e

sustentabilidade.

…………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

Igualmente a Lei Orgânica do Município[4] determina que:

 

“Art. 86 A Administração Pública Direta e Indireta, de quaisquer dos Poderes do Município, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e também o seguinte:

…………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

Isso porque, em que pese a regulamentação das leis ser competência do Chefe do Poder Executivo, somente a lei em sentido estrito tem o poder de inovar no ordenamento jurídico, delimitando o âmbito e os limites a serem observados pelo Executivo no exercício do poder regulamentar. Logo, não pode o decreto regulamentador dispor sobre as condições, critérios e destinação da multa não previstas pelo legislador, tal como visa permitir o art. 2º da Proposição de Lei nº 068/2025.

Nessa perspectiva, a prerrogativa do poder de polícia, em limitar ou condicionar atividades, só pode ser legitimamente exercida quando respeitada a função do Poder Legislativo em inovar a ordem jurídica. Em outras palavras, a cominação de sanções e penalidades são temas afetos à reserva legal, não cabendo ao Prefeito dispor sobre a matéria em decreto (artigo 2º da Proposição de Lei nº 068/2025).

Nesse contexto, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[5] possui o seguinte entendimento:

 

“Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade suscitado pela 18ª Câmara de Direito Público na Apelação Cível nº 1001472-21.2022.8.26.0625 questionando a constitucionalidade do art. 4º, § 1º, do Decreto Municipal nº 14.479/19, do Município de Taubaté. Obrigação prevista em decreto municipal, com aplicação de multa, sem amparo em lei específica. Necessidade de lei em sentido estrito para a imposição de obrigações e sanções. Afronta ao princípio da legalidade. Incidente acolhido, com determinação de retorno dos autos à Câmara Suscitante” (Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Cível nº 0022579-39.2023.8.26.0000, Relator Desembargador Fábio Gouvêa, Órgão Especial, j. 13/09/2023). (grifos acrescidos)

 

Soma-se a isso o fato que o art. 1º[6] da Proposição de Lei nº 068/2025 visa “autorizar o Poder Executivo a adotar medidas administrativas voltadas à regulamentação da aplicação de multa”. No entanto, a aplicação de multa pressupõe que ela esteja definida em lei. Sendo assim, a autorização para o Executivo “regulamentar a aplicação” sem prévia previsão legal dos seus valores, por exemplo, afronta também o poder regulamentar para a fiel execução das leis.

Nessa toada, a Constituição Federal, de 1988, e a Constituição do Estado e Minas Gerais, de 1989, determinam, respectivamente:

 

“Art. 84.  Compete privativamente ao Presidente da República:

…………………………………………………………………………………………………………………….

IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;

……………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

“Art. 90.  Compete privativamente ao Governador do Estado:

…………………………………………………………………………………………………………………….

VII – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis e, para sua fiel execução, expedir decretos e regulamentos;

……………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

Por simetria, a Lei Orgânica do Município determina:

 

“Art. 71 Compete ao Prefeito, entre outras atribuições:

……………………………………………………………………………………………………………………

VI – expedir decretos, portarias e outros atos administrativos;

……………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – TJMG também entende que o decreto é ato normativo derivado, que deve dar fiel execução à lei:

 

“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – DECRETO LEGISLATIVO N. 006/2023 DO MUNICÍPIO DE CONSELHEIRO LAFAIETE – SUSPENSÃO DOS EFEITOS DO DECRETO N. 382/2022 DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL – ABUSO DO PODER REGULAMENTAR – SUPRESSÃO E RESTRIÇÃO DE DIREITOS – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES – PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE. O decreto regulamentar do Chefe do Poder Executivo é ato normativo derivado, que deve complementar o conteúdo da lei para a sua efetiva execução, vedada a criação ou supressão de direitos e obrigações, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes e sustação do ato normativo pelo Poder Legislativo. A suspensão dos efeitos do Decreto n. 382/2022 pelo Decreto Legislativo impugnado não configura intromissão em competência privativa do Chefe do Poder Executivo Municipal, porquanto o Decreto n. 382/2022 ultrapassa os ditames da legislação municipal que se pretende complementar, restringindo direitos sem amparo no texto legal.  (TJMG –  Ação Direta Inconst  1.0000.23.162071-7/000, Relator(a): Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes , ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 28/02/2024, publicação da súmula em 08/03/2024)” (grifos acrescidos)

 

Isso porque não cabe à proposição de lei autorizar o Executivo a criar multas e permitir que os seus elementos essenciais (critérios, valores, condições de aplicação, destinação) sejam definidos por meio de decreto, devendo isso ser feito por lei em sentido estrito.

 

DA CONCLUSÃO

 

Diante de todo o exposto, delegar a definição dos critérios, valores, condições de aplicação e destinação da multa ao Executivo, em vez de criá-los diretamente na lei, torna a proposta inconstitucional por afronta ao princípio da legalidade disposto no caput do art. 37 da Constituição Federal, de 1988, e no caput do art. 13 da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989, além de contrariar a função regulamentar do decreto de dar fiel execução ao disposto em lei, conforme determina o inciso IV do caput do art. 84 da Constituição Federal, de 1988, e o inciso VII do art. 90 da Constituição Estadual, de 1989.

Portanto, são essas, Senhor Presidente, as razões que me levam a opor veto total à Proposição nº 068/2025, devolvendo-a, em obediência ao § 4º do art. 53 da Lei Orgânica Municipal, ao necessário reexame dessa Egrégia Casa Legislativa.

 

 

PAULO HENRIQUE PAULINO E SILVA

PREFEITO DO MUNICÍPIO DE SANTA LUZIA

[1] Art. 2º A definição dos critérios, valores, condições de aplicação e destinação da multa, caso venha a ser implantada, poderá ser realizada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo, observada, no que couber, a Lei Municipal nº 4.381, de 28 de dezembro de 2022, e demais normas correlatas.
[2] Link para consulta disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
[3] Link para consulta disponível em: https://dspace.almg.gov.br/bitstream/11037/62829/6/Constituicao%20Estadual%20Atualizadal%2035%c2%aa%20Edicao%20%5bDM%5d%20jun25-A.pdf
[4] Link para consulta disponível em: https://leismunicipais.com.br/lei-organica-santa-luzia-mg
[5] Link para consulta disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/resultadoCompleta.do
[6] Art. 1º Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a adotar, no âmbito do Município de Santa Luzia/MG, medidas administrativas voltadas à regulamentação da aplicação de multa aos responsáveis pelo manuseio, utilização e soltura de fogos de artifício ou artefatos pirotécnicos que emitam estampidos ou efeitos sonoros de alta intensidade.

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