MENSAGEM Nº 072/2025

MENSAGEM Nº 072/2025

Santa Luzia, 08 de agosto de 2025

Excelentíssimo Senhor Presidente,

Dirijo-me a Vossa Excelência, com cordiais cumprimentos, para comunicar que, com base no § 1º do art. 53 e no inciso IV do caput do art. 71 da Lei Orgânica Municipal, decidi opor VETO INTEGRAL à Proposição de lei nº 147/2025, que “Autoriza a construção de um parque linear no espaço compreendido entre a Avenida Ângelo Teixeira da Costa entre os números 32 a 240, paralelo a Rua F e esquina com a Rua E, no bairro Frimisa (Carreira Comprida)”, de autoria do Vereador Glayson Johnny.

 

Verificados os pressupostos essenciais para as razões que adiante se apresentam, temos o conflito ensejador da oposição por motivação de inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos e fundamentos apresentados a seguir.

Razões do Veto:

I – DA INCONSTITUCIONALIDADE POR VÍCIO DE INICIATIVA E POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES

 

Observa-se que a propositura pretende autorizar o Poder Executivo a construir “um parque linear no espaço compreendido entre a Avenida Ângelo Teixeira da Costa entre os números 32 a 240, paralelo a Rua F e esquina com a Rua E, no bairro Frimisa (Carreira Comprida)”, o que contraria a regra de fixação de competência para a iniciativa de processo legislativo. Isso porque compete ao Prefeito Municipal iniciar o presente Projeto de Lei, já que obras públicas envolvem a execução de projetos e a alocação de recursos que são, tipicamente, atribuições do Poder Executivo, uma vez que são medidas administrativas de gestão reservada ao Executivo Municipal.

 

Por isso, há violação da regra de iniciativa privativa do Executivo, utilizada por simetria e prevista no inciso XIV do caput do art. 90 da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989[1], e afronta ao princípio da separação de poderes. constitucionalmente positivado no art. 2º da Constituição Federal, de 1988[2], e no art. 6° no art. 173, ambos da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989 in verbis, respectivamente:

 

“Art. 90.  Compete privativamente ao Governador do Estado:

……………………………………………………………………………………………………………………..

XIV – dispor, na forma da lei, sobre a organização e a atividade do Poder Executivo;

……………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

“Art. 2º  São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” (grifos acrescidos)

 

“Art. 6º São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” (grifos acrescidos)

 

“Art. 173.  São Poderes do Município, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo e o Executivo.

§ 1º  Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, é vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições, e, a quem for investido na função de um deles, exercer a de outro.

……………………………………………………………………………………………………………………” (grifos acrescidos)

 

Nessa perspectiva, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG[3] já entendeu sobre a iniciativa de leis que versam sobre as matérias relativas à organização administrativa e à execução de obras públicas de interesse local:

 

“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI Nº 3.579/2014 DO MUNICÍPIO DE LAGOA SANTA – MEDIDAS DE PADRONIZAÇÃO PARA CONSTRUÇÃO DE QUEBRA-MOLAS – PROJETO DE LEI DE INICIATIVA DO PODER LEGISLATIVO – MATÉRIA DE NATUREZA ADMINISTRATIVA – VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO E INDEPENDÊNCIA ENTRE OS PODERES – PEDIDO PROCEDENTE. 1. É inconstitucional lei elaborada pelo Poder Legislativo que trata de matéria cuja iniciativa foi constitucionalmente atribuída ao Poder Executivo, pois, neste caso, há ofensa ao princípio da separação dos poderes (artigos 6º e 173 da Constituição do Estado). 2. Compete privativamente ao Prefeito a iniciativa de leis que disponham sobre as matérias relativas à organização administrativa e à execução de obras públicas de interesse local, sobretudo quando se constata que a norma implica – ainda que indiretamente – em despesas não previstas no planejamento financeiro e orçamentário do Município.  (TJMG –  Ação Direta Inconst  1.0000.14.079427-2/000, Relator(a): Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes , ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 27/04/2016, publicação da súmula em 13/05/2016)” (grifos acrescidos)

 

Outrossim, eventual argumento de que a proposição se trata, caso sancionada, de mera lei autorizativa não tem o condão de afastar o vício formal de iniciativa, uma vez que não pode o Poder Legislativo autorizar a prática de atos cuja competência exclusiva é fixada pela própria Constituição ao Poder Executivo, sob pena de subverter o regramento constitucional da separação e independência dos Poderes.

 

Sendo assim, a lei que autoriza o Poder Executivo a agir em matérias de sua iniciativa privada implica, em verdade, uma determinação, sendo, portanto, inconstitucional. E, nesse sentido, já se manifestou o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

 

“LEIS AUTORIZATIVAS – INCONSTITUCIONALIDADE – Se uma lei fixa o que é próprio da Constituição fixar, pretendendo determinar ou autorizar um Poder constituído no âmbito de sua competência constitucional, essa lei e inconstitucional. — não só inócua ou rebarbativa, — porque estatui o que só o Constituinte pode estatuir O poder de autorizar implica o de não autorizar, sendo, ambos, frente e verso da mesma competência – As leis autorizativas são inconstitucionais por vicio formal de iniciativa, por usurparem a competência material do Poder Executivo e por ferirem o princípio constitucional da separação de poderes.VÍCIO DE INICIATIVA QUE NÃO MAIS PODE SER CONSIDERADO SANADO PELA SANÇÃO DO PREFEITO – Cancelamento da Súmula 5, do Colendo Supremo Tribunal Federal. LEI MUNICIPAL QUE, DEMAIS IMPÕE INDEVIDO AUMENTO DE DESPESA PÚBLICA SEM A INDICAÇÃO DOS RECURSOS DISPONÍVEIS, PRÓPRIOS PARA ATENDER AOS NOVOS ENCARGOS (CE, ART 25). COMPROMETENDO A ATUAÇÃO DO EXECUTIVO NA EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO – ARTIGO 176, INCISO I, DA REFERIDA CONSTITUIÇÃO, QUE VEDA O INÍCIO DE PROGRAMAS. PROJETOS E ATIVIDADES NÃO INCLUÍDOS NA LEI ORÇAMENTÁRIA ANUAL (TJSP, ADI 142.519-0/5-00, Rel. Des. Mohamed Amaro, 15-08-2007). (grifos acrescidos)

 

II – DA INCONSTITUCIONALIDADE POR POSSÍVEL CRIAÇÃO DE DESPESA SEM PRÉVIA ELABORAÇÃO DE ESTIMATIVA DO SEU IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO

 

Soma-se a isso o fato que a construção de um parque linear, mesmo que apenas “autorizada”, implica, em regra, licitação, execução de obra, gestão de recursos e, por conseguinte, potencial geração de despesas para o Município. No entanto, a Proposta não indica os recursos orçamentários necessários para a cobertura dos gastos decorrentes da construção do parque linear.

 

E, nesse sentido, o art. 113 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, determina que “a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”. Já os incisos I e II do caput do art. 161 da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989, e os incisos I e II do caput do art. 167 da Constituição Federal, de 1988, dispõem que são vedados o início de programa ou projeto não incluídos na Lei Orçamentária Anual e a realização de despesa ou assunção de obrigação direta que excedam os créditos orçamentários ou adicionais. Veja-se, respectivamente:

 

“Art. 161.  São vedados:

I – o início de programa ou projeto não incluídos na Lei Orçamentária anual;

II – a realização de despesa ou assunção de obrigação direta que excedam os créditos orçamentários ou adicionais;

……………………………………………………………………………………………………………………”

 

“Art. 167.  São vedados:

I – o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual;

II – a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais;

……………………………………………………………………………………………………………………”

 

Portanto, a ausência dos referidos recursos impede o cumprimento da gestão financeira responsável, tendo em vista a importância da transparência no que concerne ao dispêndio daquilo que se aprova em lei, a fim de se saber se há lastro fiscal suficiente para se sustentar inovações nas políticas públicas.

 

Nessa perspectiva, o § 1º do art. 1º da Lei Complementar Federal nº 101, de 04 de maio de 2000, Lei de Responsabilidade Fiscal[4], determina a responsabilidade na gestão fiscal compreende a prevenção de riscos e a correção de desvios, com a finalidade de se manter o equilíbrio das contas públicas. Assim, com o intuito de se alcançar a manutenção do mencionado equilíbrio financeiro, a citada Lei Complementar Federal limita os atos administrativos e legislativos que aumentem gastos ou reduzam receita, nos termos dos arts. 16 e 17 que preveem o seguinte:

 

“Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

………………………………………………………………………………………..

§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas;

………………………………………………………………………………………..” (grifos acrescidos).

 

“Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio. (grifos acrescidos).

……………………………………………………………………………………………”

 

Note-se que, além da necessária compatibilidade do ato legislativo ou com a Lei de Responsabilidade Fiscal, o inciso II do caput do art. 16, acima transcrito, estabelece que haja “adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias”.

 

Dessa forma, conforme demonstrado, a Proposta se mostra novamente inconstitucional, haja vista que o Poder Legislativo visa autorizar a construção de parque linear que ocasiona gastos não previstos para o Município, trazendo dispêndios irregulares ao erário que além de não dispor dos recursos necessários para garantir a execução da despesa, não conta com a previsão orçamentária precedente, o que é elementar para cumprir os regramentos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

 

III – DA CONCLUSÃO

 

Dado o exposto, a propositura se mostra inconstitucional por vício de iniciativa (inciso XIV do caput do art. 90 da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989), afrontar o princípio da separação de poderes (artigo 2º da Carta Magna e ao art. 6° da Constituição Estadual), bem como acarretar possível criação de despesa sem estar acompanhado da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro (art. 113 dos Atos das Disposições Transitórias, I e II do caput do art. 161 da Constituição do Estado de Minas Gerais, de 1989, e os incisos I e II do caput do art. 167 da Constituição Federal, de 1988).

 

Portanto, são essas, Senhor Presidente, as razões que me levam a opor veto total à Proposição de Lei nº 147/2025, devolvendo-a, em obediência ao § 4º do art. 53 da Lei Orgânica Municipal, ao necessário reexame dessa Egrégia Casa Legislativa.

 

 

PAULO HENRIQUE PAULINO E SILVA

PREFEITO DO MUNICÍPIO DE SANTA LUZIA

[1] Link para consulta disponível em: https://www.almg.gov.br/atividade-parlamentar/leis/legislacao-mineira/lei/texto/?tipo=CON&num=1989&ano=1989&comp=&cons=1

[2] Link para consulta disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm

[3] Link para consulta disponível em: https://www5.tjmg.jus.br/jurisprudencia/pesquisaNumeroCNJEspelhoAcordao.do?&numeroRegistro=2&totalLinhas=2&paginaNumero=2&linhasPorPagina=1&numeroUnico=1.0000.14.079427-2/000&pesquisaNumeroCNJ=Pesquisar&

[4] Link para consulta disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm

 

Comentários

    Categorias